Polarizador e abertamente racista, Jean-Marie Le Pen era uma figura controversa na política francesa. Ele é o fundador do partido Frente Nacional, hoje Reunião Nacional, e é pai de Marine Le Pen, nome mais forte da extrema direita francesa. Jean-Marie Le Pen em imagem do dia 7 de setembro de 2007, em Saint-Cloud, França
Thomas Coex/AFP/Arquivo
Jean-Marie Le Pen, um líder histórico da extrema direita na França, morreu aos 96 anos nesta terça-feira (7), afirmou a família à agência de notícias France Presse (AFP). Jean-Marie é pai de Marine Le Pen, principal nome da extrema direita na política francesa atualmente.
Ele estava internado em uma casa de repouso há várias semanas devido à sua saúde debilitada e morreu ao meio-dia (8h no horário de Brasília) “cercado por sua família”, afirmou a família em nota à AFP.
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Polarizador e abertamente racista, Jean-Marie Le Pen era uma figura controversa na política francesa. Ele também era tinha ideais extremistas em outros temas, como gênero e imigração. Ele concorreu cinco vezes à Presidência da França, todas sem sucesso. A última delas foi em 2007.
Le Pen fundou em 1972 a Frente Nacional, atual Reunião Nacional (RN), um partido que inicialmente reunia neofascistas e depois foi se moderando. O RN, no entanto, permanece sendo o principal da extrema direita na França e ainda carrega alguns de seus ideais, como o caráter anti-imigração.
Jean-Marie acumulou condenações na Justiça em casos de antissemitismo e era constantemente acusado de xenofobia e racismo. Em um dos casos, ele foi condenado e multado em 1996 por contestar crimes de guerra dos nazistas durante a 2ª Guerra Mundial ao dizer que as câmaras de gás, utilizadas para matar judeus, eram “apenas um detalhe” da história do conflito. O comentário provocou indignação na França.
Jean-Marie era negacionista da tragédia humanitária ocorrida na 2ª Guerra Mundial, o que o levou a condenações e tensionou suas alianças políticas. Seu negacionismo o fez ser expulso do Reunião Nacional por sua filha, Marine, em 2015. O político comandou o partido até 2011.
Sua expulsão do RN, que ocorreu por ele ter dito que mantém suas declarações sobre o Holocausto, causou um “racha” na família. Jean-Marie acusou Marine de traição e disse ter vergonha que a presidente do partido levasse seu nome.
Mais recentemente, Jean-Marie e outros membros do Reunião Nacional, como Marine Le Pen e sua outra filha, Yann, foram acusados de usar dinheiro destinado a assistentes parlamentares da União Europeia para pagar funcionários que, em vez disso, realizavam trabalho político para o partido entre 2004 e 2016, uma violação às regras regulamentos do bloco. Jean-Marie foi considerado inapto para testemunhar.
Marine, no entanto, foi julgada em 2024 e sua sentença no caso está programada para ser anunciada em 31 de março. Os promotores pediram cinco anos de prisão para ela e a suspensão de seus direitos políticos por cinco anos, o que pode comprometer suas ambições de concorrer novamente à presidência, em 2026.
A morte de Jean-Marie ocorreu enquanto Marine Le Pen está em viagem ao território francês de Mayotte, que ainda sofre as consequências do ciclone Chido, que matou 39 pessoas e deixou um rastro de destruição.
O presidente francês Emmanuel Macron, um centrista, expressou “suas condolências à família e aos amigos (de Le Pen)”, em uma declaração curta, diferentemente do usual, emitida pelo palácio presidencial.
“Uma figura histórica da extrema direita, ele desempenhou um papel na vida pública de nosso país por quase 70 anos, o que agora é uma questão para a história julgar”, disse Macron na declaração.
O atual presidente do Reunião Nacional, Jordan Bardella, lamentou a morte de Jean-Marie. “Engajado sob o uniforme do exército francês na Indochina e na Argélia, tribuno do povo na Assembleia Nacional e no Parlamento Europeu, ele sempre serviu à França, defendeu sua identidade e sua soberania”, escreveu Bardella em publicação no X.
Quem foi Jean-Marie Le Pen
Jean-Marie Le Pen, então líder do partido Frente Nacional, gesticula durante coletiva de imprensa no Parlamento Europeu em Estrasburgo, em 13 de janeiro de 1985.
Jean-Claude Delmas/AFP
Nascido em 20 de junho de 1928 em La Trinité-sur-Mer, no oeste da França, e formado em direito, Jean-Marie, lutou em guerras e deixou um legado na política francesa.
Figura constante por décadas na política francesa, Jean-Marie Le Pen era um astuto estrategista político e orador talentoso, que usava seu carisma para cativar as multidões com sua mensagem anti-imigração.
O robusto e grisalho filho de um pescador bretão se via como um homem com uma missão: manter a França francesa sob a bandeira do Reunião Nacional. Escolhendo Joana d’Arc como santa padroeira do partido, Le Pen fez do Islã e dos imigrantes muçulmanos seu principal alvo, culpando-os pelos problemas econômicos e sociais da França.
Ex-soldado paraquedista e legionário estrangeiro que lutou na Indochina (1953) e na Argélia (1957), ele liderou simpatizantes em batalhas políticas e ideológicas com um estilo que se tornou uma marca registrada de sua carreira.
“Se eu avançar, me sigam; se eu morrer, vinguem-me; se eu me esquivar, me matem”, disse Le Pen em um congresso do partido em 1990, refletindo o estilo teatral que, por décadas, alimentou o fervor de seus seguidores.
O político foi candidato à Presidência da França cinco vezes. Em 2002, chegou ao segundo turno, sendo derrotado por esmagadora maioria por Jacques Chirac.
Eleição após eleição, ele assumia o papel de pária, forçando os rivais a se apressarem para combatê-lo, e, às vezes, rebaixarem-se para roubar votos seus do eleitorado da extrema direita.
Ele foi eleito em 1956 à Assembleia Nacional, equivalente à Câmara dos Deputados no Brasil, e foi derrotado nas legislativas de 1962. Em 1984, ele foi eleito eurodeputado, e nas legislativas de 1986, foi novamente eleito à Assembleia Nacional francesa.
Marine Le Pen é saudada pelo pai, Jean-Marie Le Pen, no final de uma campanha em 30 de março de 2012, em Nice, sudeste da França
Boris Horvat/AFP/Arquivo