Em entrevista à BBC, ex-Beatle falou sobre os perigos da inteligência artificial para os músicos. Paul McCartney em show em Londres em dezembro de 2024
Reuters
O astro do rock e ex-Beatle Paul McCartney disse à BBC que mudanças propostas na legislação de direitos autorais podem permitir que tecnologias que “roubam os artistas e músicos” sejam implementadas, impossibilitando todos de ganhar a vida fazendo música.
O Reino Unido está considerando uma revisão da lei que permitiria que desenvolvedores de inteligência artificial (IA) usem o conteúdo de criadores na internet para ajudar a desenvolver seus modelos — a menos que os detentores dos direitos se manifestem expressamente contra isso.
Em uma rara entrevista para a BBC, Paul disse que “quando éramos crianças em Liverpool, encontramos um emprego que amávamos, mas que também pagava as contas”. Para ele, as propostas poderiam remover o incentivo para escritores e artistas e resultar em uma “perda de criatividade”.
O governo disse que pretende criar segurança jurídica por meio de um regime de direitos autorais que forneça aos criadores “controle real” e transparência.
Paul disse à BBC: “Você tem rapazes, moças, surgindo que escrevem uma música linda, e eles não são donos dela. Eles não têm nada a ver com ela. E qualquer um que quiser pode simplesmente roubá-la.”
“A verdade é que o dinheiro está indo para algum lugar… Alguém está sendo pago, então por que não deveria ser o cara que se sentou e escreveu Yesterday?”
Ele fez um apelo ao governo para revisar os planos atuais, dizendo: “Nós somos o povo, vocês são o governo! Vocês deveriam nos proteger. Esse é o seu trabalho.”
“Se você está apresentando um projeto de lei, tenha certeza de que está protegendo os pensadores criativos, os artistas criativos, ou você não terá mais eles.”
Paul McCartney, George Harrison, Ringo Starr e John Lennon em 1967
PA Media
Programas de inteligência artificial generativa (o tipo de AI que cria conteúdos novos, como textos, imagens, músicas e vídeos que parecem ter sido feito por um humano) fazem mineração de dados — ou seja, eles “aprendem” como gerar conteúdo através da análise de grandes quantidades de dados.
O governo do Reino Unido está atualmente consultando propostas que permitiriam que empresas de inteligência artificial usem material disponível na internet sem respeitar direitos autorais no processo de mineração de texto ou dados.
As propostas dariam aos artistas ou criadores uma chamada “reserva de direitos” — a capacidade de optar por não ter seu conteúdo sujeito à mineração.
Mas os críticos do plano acreditam que não é possível para um escritor ou artista individual notificar milhares de diferentes provedores de serviços de inteligência artificial de que não querem que seu conteúdo seja usado dessa forma, ou monitorar como seu trabalho está sendo usado em toda a internet.
Uma proposta alternativa para que os artistas optem por dar sua permissão para que seu conteúdo seja usado será apresentada na Câmara dos Lordes esta semana.
Tom Kiehl, presidente-executivo da UK Music, que representa diversos produtores culturais no Reino Unido, disse: “os planos do governo de mudar a lei de direitos autorais para facilitar que empresas de IA usem a música de artistas, compositores e empresas musicais sem sua permissão colocam a indústria musical em um grande risco”.
“Seria uma aposta arriscada contra o setor criativo que já está contribuindo com mais de 120 bilhões de libras (mais de R$ 870 bilhões) para a economia e seria contraproducente para as próprias ambições de crescimento do governo.”
“Não há evidências de que os criadores de conteúdo possam efetivamente ‘optar por evitar’ que seu trabalho seja treinado por sistemas de IA e, portanto, essa aparente concessão não oferece nenhuma garantia para aqueles que trabalham com música.”
Um porta-voz do governo disse que a indústria musical do Reino Unido produziu “alguns dos artistas mais celebrados da história”.
“É por isso que lançamos uma consulta para garantir que a estrutura de direitos autorais do Reino Unido ofereça fortes proteções para artistas com relação à IA”, diz o porta-voz.
“Nosso objetivo é fornecer segurança jurídica por meio de um regime de direitos autorais que forneça aos criadores controle real, transparência e os ajude a licenciar seu conteúdo.”
O porta-voz acrescentou que o governo estava “ansioso para ouvir as opiniões da indústria musical sobre essas propostas” e “só avançaria quando estivermos confiantes de que estamos fornecendo clareza, controle e transparência para artistas e o setor, juntamente com acesso apropriado a dados para inovadores de IA”.
Em 2023, Paul e Ringo Starr usaram IA para extrair as vozes de uma demo inacabada deixada por John Lennon para produzir uma nova música, Now and Then.
A música, anunciada como o último lançamento de uma música dos Beatles, recebeu muitos elogios e foi indicada a dois Grammys e um prêmio Brit.
Paul encerrou recentemente em Londres sua turnê Got Back, na qual o músico de 82 anos tocou na França, Espanha e Brasil.
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